Amamentar implica em escolha, decisão pessoal de cada mulher.
Hoje nos textos médicos ou nas falas de pediatras e obstetras é evidente o cuidado em não simplificar o ato de amamentar ou até moralizar o fato da mulher eventualmente optar em não alimentar seu bebê com seu leite.
Amamentar deixou de ser um ato “natural” ou uma obrigação civil ou da mulher. A experiência de médicos e enfermeiros no cuidado com as mulheres além dos achados clínicos da psicanálise foram colocando em evidência a complexidade de fatores que ficam em jogo no ato de amamentar.
Embora no começo amamentar, quase sempre, seja bastante dolorido e desconfortável e exige da mulher muita disciplina e perseverança, com a prática a mulher passa a ter sensações de prazer; é o mesmo prazer do jogo sexual, mas que ao amamentar é transformado em ternura. O mecanismo psíquico envolvido não é simples e tem relação com a história da constituição sexual da mulher. Aqui é importante lembrar que “sexual” não é sinônimo de genital, de ato sexual. Está ligado ao modo como cada um pôde construir psiquicamente seu corpo, a história do contato com o corpo materno, a liberdade ou não de experimentar diferentes sensações corporais, o modo como foi estabelecida a disciplina da aquisição da limpeza e da ordem.
O prazer de mamar (peito ou mamadeira), a vivência do próprio corpo nas ações de higiene realizadas pelos pais, ser tocado, pego no colo iniciam a construção da sexualidade humana. Envolvem energia vital que denominamos de libido. Estabelece-se um conjunto complexo de sensações que envolvem o corpo todo e uma cadeia de representações que vão constituir a vida psíquica. Não é pouco lembrar que o prazer, a libido são o motor e a condição da vida mental. Vivemos para buscar prazer. O bebê, quando amamentado no peito, tem que fazer força, se empenhar em buscá-lo.
Do ponto de vista do bebê ao viver a experiência de união e intimidade com a mãe e o pai, possibilita a ele o contato com a realidade. A constituição do psiquismo está fundamentada na vivência de prazer compartilhado que a amamentação e o contato próximo proveem.
O pai (ou pessoas que convivem com a mãe) tem uma função central nesse percurso: a manutenção do tempo que a mãe precisa para estabelecer e manter um contato próximo com o bebê depende do seu apoio.
Ao longo de uma mamada completa o bebê não recebe um leite único, de composição fixa: recebe um produto dinâmico, mutável, com características distintas e ajustáveis a cada momento em que se encontra mamando.
Gostaríamos de fazer uma muito pequena síntese apenas para indicar a complexidade em termos da química e fisiologia do leite materno. A primeira é a fração emulsão que corresponde à fase lipídica do leite, onde se concentram os óleos, as gorduras, os ácidos graxos livres, as vitaminas e demais constituintes lipossolúveis, a exemplo de pigmentos como o beta-caroteno. A segunda é a fração suspensão na qual as proteínas –caseínas- e quase a totalidade do cálcio e fósforo do leite se encontram presentes na forma micelar, constituindo uma suspensão coloidal do tipo gel. A terceira é a fração solução que corresponde à fase que congrega todos os constituintes hidrossolúveis, como vitaminas, minerais, carboidratos, proteínas, enzimas e hormônios, podendo ser considerado o soro do leite.
João Agripino de Almeida, especialista em amamentação, explicita que não existe nenhum outro alimento tão completo – e complexo- como o leite humano, impossível de ser reproduzido. As três frações se relacionam de forma harmônica criando um nexo comum, formando um conjunto para tudo que vai sendo desenvolvido no interior do próprio leite materno.